UNESCO, YOGA E MAHÃBHÃRATA: HISTÓRIA E PATRIMÔNIO CULTURAL IMATERIAL DA ÍNDIA
Janaina Cardoso de Mello
Em dezembro de 2016, a imprensa europeia anunciou ao mundo que o Yoga da Índia fora declarado Patrimônio Imaterial da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e a Cultura (UNESCO), durante a reunião do Comité Intergovernamental em Adis Abeba, na Etiópia. Considerou-se ter a filosofia vinculada à prática influenciado: “[...] numerosos aspectos da sociedade deste país, que vão desde a saúde à medicina, até à educação e as artes” (DIÁRIO DE NOTÍCIAS, 01/12/2016).
Guardiã das memórias, histórias e culturas dos povos, como viés de educação, turismo e ciência,
“A UNESCO destacou ainda a ‘unificação da mente, do corpo e da alma para melhorar o bem-estar mental, físico e espiritual das pessoas’ para quem exercita esta prática. Esta prática cultural é transmitida segundo o modelo de ensinamento mestre-aluno, mas atualmente existem mosteiros, instituições educativas e centros comunitários que também contribuem para a sua transmissão” (OBSERVADOR, 01/12/2016).
Deve-se recordar o fato de ter sido o patrimônio imaterial chancelado na 32ª Sessão da Conferência Geral das Nações Unidas, de 17 de outubro de 2003 na Convenção para Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial que resultou na Carta Patrimonial conhecida como a Recomendação de Paris.
O documento retoma outros dois momentos importantes desse processo: a Recomendação da UNESCO sobre a salvaguarda da cultura tradicional e popular, de 1989, assim como a Declaração Universal da UNESCO abordando a Diversidade Cultural de 2001, e a Declaração de Istambul, de 2002 (IPHAN, 2017, p.1).
A Recomendação de Paris de 2003, além de ressaltar a necessidade de conscientização sobre o valor do patrimônio imaterial e seu mútuo reconhecimento (local, nacional e internacional), além do exercício de cooperação e assistência internacionais, trouxe ainda o conceito de “patrimônio imaterial” como:
“[...] as práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares que lhes são associados – que as comunidades, os grupos e, em alguns casos os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural. Esse patrimônio cultural imaterial, que se transmite de geração em geração, é constantemente recriado pelas comunidades e grupos em função de seu ambiente, de sua interação com a natureza e de sua história, gerando um sentimento de identidade e continuidade, contribuindo assim para promover o respeito à diversidade cultural e à criatividade humana” (IPHAN, 2017, p.2-3).
Importante também é ressaltar a Declaração de Issyk-Kul sobre o Diálogo entre Culturas e Civilizações na Eurásia, de 2004, por reafirmar que é através do diálogo e interação entre distintos vetores culturais que se sobressai “[...] a capacidade humana e social para a criação, expressão e inovação, bem como para a reconciliação” (CABRAL, 2011).
Por isso, nada mais justo do que contemplar com uma chancela patrimonial um dos subcontinentes asiáticos mais criativos, tanto em suas concepções religiosas e filosóficas, quanto em seus vocábulos originários de idiomas, em sua gastronomia, sua arte, seu vestuário, músicas, modos de ser, viver e ver o mundo.
Demarcada ao note pelo Himalaia, a Índia superou seu isolamento geográfico através de suas costas banhadas pelo Oceano Índico, cujas rotas marítimas possibilitou o contato com Ocidente e Oriente. E como salientou o historiador Edgard Leite (1997, p.7):
“[...] é na região compreendida entre o Ganges e o seu grande tributário, o rio Yamuna, que encontramos o coração da Índia, ou melhor, da cultura que consolidou, ao longo dos séculos, a identidade cultural-religiosa de grande parte da população do subcontinente. Foi essa a região que em tempos pretéritos tornou-se conhecida como Aryavarta, a terra dos aryas, ou seja, o local onde se estabeleceram os míticos fundadores da cultura védica, os ários ou arianos”.
A Índia não é uma “ilustre desconhecida”, pois em período anterior e posterior à Heródoto apareceu em vários relatos. Missionários jesuítas e mercadores visitaram seu território. Portugueses, franceses, neerlandeses e ingleses também não a ignoravam. Embora, somente no século XVIII surge a figura do historiador da história da Índia, em Calcutta (FONSECA, 1999, p.208).
Grandes riquezas da cultura indiana podem ser encontradas nas narrativas históricas, mitológicas e identitárias da literatura védica. Mas o que são os escritos védicos? De acordo com Gosvãmi (1986, p.1) “as escrituras védicas compreendem um todo harmonioso com uma conclusão harmoniosa” tendo como marco original o siddhãnta (conclusão filosófica) védico. Assim,
“As escrituras védicas são de amplo escopo. Só o Rig Veda contém 1.017 hinos, o Mahãbhãrata consiste em 110.000 dísticos e os dezoito Purãnas principais que contêm centenas e milhares de versos” (GOSVÃMI, 1986, p.2).
Salienta-se, no entanto, que a história da Índia tem sido tradicionalmente referenciada em seus períodos religiosos que compreendem além do védico, a presença dos períodos bramânico e do clássico (bramânico renovado). Entretanto, a primeira leva de produções historiográfica sobre a Índia, ao serem oriundas de intelectuais ingleses terminaram por acentuar preconceitos e marcas colonizadoras.
A construção de um tipo de representação da Índia como um território da “espiritualidade” sem o aprofundamento de seu viés político, econômico e social, reduzindo os elementos culturais à religiosidade e à visão de um tempo imóvel e sem mudanças caracterizou as primeiras obras produzidas por James Mill (“History of British India”, de 1817), Vincent Smith (“Early History of India”, de 1904) e Hermann Oldenberg (“A Literatura da Índia Antiga”, de 1956) onde, nesta última, até o Mahãbhãrata é comparado de modo depreciativo com as epopeias gregas (FONSECA, 1999, p.210).
Somente na virada do século XX, as primeiras gerações de historiadores indianos assumem o protagonismo dos escritos de si, de seu tempo e de seu espaço, entretanto, intelectuais como R. G. Bhandarkar ainda reproduziam as influências inglesas em seus trabalhos, cujas fontes eram predominantemente a literatura sânscrita, proveniente da elite cultural dominante indiana (FONSECA, 1999).
Entre as décadas de 1920 e 1930, uma segunda onda de historiadores indianos, sob a égide dos movimentos nacionalistas e de independência, à exemplo de K. P. Jayaswal e A. K. Coomaraswami, buscaram erigir a narrativa de um “passado glorioso”, com muitas manifestações da cultura grega em sua própria trajetória, assim, afirmava-se que:
“se à Índia faltavam o racional e o pragmático, era necessário afirmar que a cultura indiana era essencialmente espiritualista, oposta à civilização ocidental materialista, e por isso era superior a ela” (FONSECA, 1999, p.211).
Consolidada a independência, um novo horizonte surgiu para o trabalho historiográfico na Índia. As investigações deixaram de se concentrar apenas nas fontes literárias e passaram a buscar dados contidos em pesquisas arqueológicas, etnológicas, epigráficas, numismáticas, dentre outras, além de novas metodologias de tratamento e análise da informação. Com isso, ocorre um aprofundamento do sentido da escrita histórica e
“[...] reconhece-se como fio condutor a ideia de que mudanças no sistema político estão inextricavelmente entretecidas com mudanças na estrutura econômica, que, por sua vez, influenciam as relações sociais; que, se um movimento religioso, por exemplo, se arraiga, então a atração que ele exerce deve guardar uma relação com o lugar social dos que o apoiam; que, se um dialeto adquire foros de língua e se uma literatura se formaliza nessa língua, então algo profundamente significativo aconteceu não só linguística e literariamente com os falantes dessa língua” (FONSECA, 1999, p.212).
Variações regionais e históricas do padrão cultural, com mudanças que nem semelhantes e nem simultâneas são descortinadas a partir da redução da escala do olhar de pesquisa para as histórias locais e regionais, escapando-se à homogeneização das generalizações habitais até então. Assim, tanto no Norte como no Sul da Índia, os centros de estudos passaram a guiar-se pela compreensão, com influência nas leituras de Marx, de que
“O estudo sistemático das relações entre a organização social, política e econômica e seus efeitos sobre os eventos históricos levou ao estabelecimento de relações de causa e efeito entre esses elementos e ao desenvolvimento da ideia de que é a inter-relação de uma variedade de forças que determina os eventos, cuja chave é os meios de produção” (FONSECA, 1999, p.212).
A ideia de periodização começou a ser relegada ao passado historiográfico, tendo-se me conta que distintas fases históricas ocorreram nas sociedades sem necessariamente aplicarem-se ao mesmo tempo e de igual forma. Essa nova fase dos escritos históricos sobre a Índia é fortemente representada pela obra “History of India” (1966) de Romila Thapar (FONSECA, 1999, p.213).
Mas onde os Vedas, o Mãhãbhãrata e o Yoga entram nessa cadeia de acontecimentos mutatis mutandi? De acordo com Heinrich Zimmer (1986, p.238) o surgimento da filosofia hindu ortodoxa provém da religião ária dos Veda, com seu panteão que “projetavam as experiências e ideias do homem sobre si mesmo”.
Os seguidores de Vishnu (uma entidade que auxiliou os deuses a livrarem-se de um inimigo, o rei Bali), os cantos de 25 a 42 do Mãhãbhãrata configuram-se como os textos fundamentais para sua prática religiosa. Esse texto foi denominado Bhagavad-Gita, ou, “o canto do senhor” (LEITE, 1997, p.61).
“O Bhagavad-Gita é a passagem do Mahabharata que transcorre pouco antes da batalha de Kurukshetra, na qual se enfrentarão Pandavas e Kauravas, primos, mas adversários na luta pelo poder. Arjuna, um dos irmãos Pandava, está em um carro de guerra, pronto para o início do confronto, junto com seu auriga, Krishna- que Arjuna entende ser um poderoso príncipe. No limiar do combate, no entanto, Arjuna é tomado de remorsos e dúvidas e se questiona sobre o significado daquela luta fraticida. Krishna, então, momentaneamente interrompendo o conflito, inicialmente passa a explicar a Arjuna os seus deveres como integrante da varna kshatrya e, logo a seguir, passa a expor a natureza da condição humana e dos caminhos que devem ser seguidos para a libertação.Primeiro, explica Krishna, é necessário entender a Jñana yoga, a ‘disciplina do conhecimento’ e a Karma yoga, a ‘disciplina da ação’” (LEITE, 1997, p.62).
A literatura védica, através do conhecimento sobre autorrealização, busca apresentar o caminho para a libertação do sofrimento. Pretende-se alcançar a transformação do ser, sendo o Bhagavad-Gita o baluarte da verdade (GOSVÃMI, 1986, p.2).
Os estudos de Leite (1997, p.61-62) sobre o Bhagavad-Gita aprofundam mais a compreensão da divindade manifesta em Krishna, que incentiva Arjuna a seguir seu dharma, além de defender “que a mais levada forma de Yoga é aquela que tem na contemplação desse senhor supremo, infinitamente poderoso, o seu mais alto objetivo”. Assim, seria o bhakti-yoga uma forma de libertação para todos os seres, independentemente de sua condição social.
“Não se pode perceber a verdadeira forma desta árvore neste mundo. Ninguém pode compreender onde ela acaba, onde começa, ou onde ela se alicerça. Mas com determinação deve-se derrubar com a arma do desapego esta árvore fortemente arraigada. Em seguida, deve-se procurar aquele lugar do qual ninguém volta após ter chegado lá e render-se a esta Suprema Personalidade de Deus de quem tudo começou e de quem tudo emana desde tempos imemoriais” (MAHÃBHÃRATA, Bhagavad-Gita, 15.4).
A passagem acima do Bhagavad-Gita refere-se à figueira-de-bengala, nutrida pela natureza material, cujos brotos são objetos dos sentidos e distintos subprodutos que variam entre o prazer e o sofrimento, atuando na renovação do karma. Por isso, põem-se a necessidade de cortar essa ligação, buscando o verdadeiro conhecimento para se chegar até Deus. Através do serviço devocional (ouvir, cantar), desapegando-se, encontra-se Krishna e sua libertação.
Para entender melhor o significado das palavras proclamadas no Mahãbhãrata, é necessário compreender o significado do Yoga como um conjunto de conhecimentos filosóficos imiscuídos na vida do povo indiano, constituindo seus valores éticos, morais, atitudinais, preceitos e técnicas espirituais, bem como seus procedimentos frente à natureza (saúde física, mental e espiritual). Através do cuidado com o “homem integral” exercia-se o cultivo do sagrado, a harmonia e a plenitude da vida (ELIADE, 2009, p.40).
O Yoga, enquanto prática ritual, aplicava técnicas adequadas de liberação do desejo e do medo que se davam pelo controle da respiração e da ampliação da consciência espiritual através da concentração e da meditação (acesso ao subconsciente) (CAMPBELL, 1990).
A pesquisadora Lilian Gulmini (2002) chama a atenção para essa relação da experiência do sagrado do homem indiano através do Yoga refletida não apenas na ritualística do processo místico, mas na própria forma de lidar com a passagem do tempo (cíclico) e assim com a própria natureza da vida e da morte (ciclo das reencarnações).
A partir dessa rápida explanação da essência histórica do Yoga e sua relação com a divindade via Baghavad-Gita, compreende-se melhor a importância desse “modo de ser e de viver” gerador de uma visão de mundo que transpassa o tempo e o espaço, do Oriente ao Ocidente, para se tornar uma prática que embora tenha se tornado culturalmente multifacetada coligiu uma coletividade.
A inscrição do Yoga na lista de bem representativo do patrimônio imaterial da humanidade, chancelado pela UNESCO em 2016, o define como
“[...] uma série de poses, meditação, controle da respiração, palavras cantadas e outras técnicas para auxiliar os indivíduos à alcançarem a autorrealização, liberando-se de qualquer sofrimento. Sua prática realizada por jovens ou idosos sem discriminação de gênero, classe ou religião tornou-o popular em outras partes do mundo” (UNESCO, 2016).
É esse aspecto que a UNESCO levou em consideração no momento da chancela desse bem imaterial enquanto patrimônio da humanidade. Ressalta-se que a Índia já possui uma extensa lista de bens classificados como patrimônio material. São 35 bens materiais com chancela concedidas, sendo os primeiros de 1983 – a Forte de Agra, as Grutas de Ajanta, a Grutas de Ellora e o Taj Mahal – e o último, o Centro histórico de Ahmadabad, de 2017 (UNESCO, 2017).
“[...] a Unesco e as políticas patrimoniais adotadas pelos diversos países do mundo, nas últimas décadas do século XX e nos anos iniciais do século XXI, empreenderam esforços no sentido de retificar a perspectiva monumentalista atribuída ao patrimônio desde meados do século XIX na França e buscaram valorizar a diversidade cultural” (PELEGRINI; FUNARI, 2008, p.43).
A lista de patrimônio imaterial da humanidade é muito recente, mas já é alvo de grande procura de inscrições. Em 2011, houve 213 elementos inscritos, sendo 96 oriundos da região da Ásia e Pacífico (CABRAL, 2011). Atualmente mais de 90 tradições possuem o selo de patrimônio imaterial da humanidade, compreendendo práticas ancestrais, músicas, danças e línguas antigas, estando mais de 26 localizadas na Ásia e no Pacífico.
A premissa das candidaturas junto à UNESCO requer que a identificação, a valorização e a promoção do patrimônio cultural imaterial venha a emergir dos detentores do patrimônio reconhecido e eleito pela própria comunidade para a manutenção de sua identidade, memória e salvaguarda, engajando-se em sua transmissão às gerações futuras.
Sob esse aspecto a decisão do Comitê avaliador da UNESCO ressaltou o papel da Sangeet Natak Akademi, que mantém o Inventário Nacional do Patrimônio Cultural Imaterial e Diversas Tradições Culturais, com a participação e consentimento dos profissionais e das partes interessadas. O Sangeet Natak Akademi também atualiza regularmente o Inventário Nacional (UNESCO, 2016).
As tradições culturais indianas têm um impacto grande também no modo de vida ocidental e isso está comprovado na decisão do Comitê avaliador da UNESCO. O Yoga por sua ancestralidade histórica, por sua tradição sagrada de bem-estar físico e espiritual, por sua vinculação com textos identitários referenciais, reunindo toda uma coletividade sem preconceitos reafirma a força da pluralidade no patrimônio cultural imaterial, bem como a necessidade de sua salvaguarda e difusão.
Os estudos de acadêmicos brasileiros a respeito dessa prática como objeto de pesquisa ainda é muito pouco referenciado, entretanto deve-se destacar a dissertação de Mestrado em Ciência das Religiões na UFPB, intitulada “O Yoga como caminho de elevação na espiritualidade e na saúde” de autoria de Vânia Cristina Lucena Lima, defendida em 2010. A pesquisadora utilizou a história oral de vida como metodologia e historicizou o Yoga em suas diferentes temporalidades da Índia até sua inserção no Brasil.
Referências
Janaina Cardoso de Mello é Pós-Doutoranda em Estudos Culturais (PACC-UFRJ); Doutora em História Social (UFRJ); Professora Adjunta de História do DHI na Universidade Federal de Sergipe (UFS), onde ministra a disciplina História e Patrimônio Cultural, docente do Mestrado Profissional em Ensino de História (ProfHistória-UFS) e do Mestrado Acadêmico em História da Universidade Federal de Alagoas (PPGH-UFAL).
E-mail: janainamello.ufs@gmail.com
CAMPBELL, J. As transformações do mito através do tempo. Trad. Heloysa Lima Dantas. São Paulo: Cultrix, 1990.
CABRAL, C. B. Patrimônio Cultural Imaterial. Convenção da Unesco e seus contextos. Lisboa: Ed.70, 2011.
DIÁRIO DE NOTÍCIAS. Yoga da Índia também é Património Imaterial da Humanidade. 01/12/2016. Disponível em: http://www.dn.pt/sociedade/interior/unesco-declara-yoga-da-india-patrimonio-imaterial-da-humanidade-5529222.html, Acesso em: 15/08/2017.
ELIADE, M. Yoga: imortalidade e liberdade. Trad. Tereza de Barros Velloso. 4ª Ed. São Paulo: Palas Athena, 2009.
FONSECA, C. A. Índia, uma História Crítica. Organon, Porto Alegre, nº 27, julho-dezembro, 1999, p. 207 – 220.
GOSVÃMI, S. D. Introdução à Filosofia Védica: a tradição fala por si mesma. São Paulo: Bhaktivedanta Book Trust, 1986.
GULMINI, L. C. O Yogasutra de Patañajali – tradução e análise da obra, à luz de seus fundamentos contextuais, intertextuais e linguísticos. Dissertação de Mestrado em Linguística. São Paulo: FFLCH-USP, 2002.
IPHAN. Recomendação de Paris. 17/10/2003. Disponível em: http://portal.iphan.gov.br/uploads/ckfinder/arquivos/Recomendacao%20Paris%202003.pdf, Acesso em: 15/08/2017.
MAHÃBHÃRATA. O Bhagavad-Gita como ele é. Trad. A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupãda. Lisboa: Printer Portuguesa, 1995.
LEITE, E. Religiões Antigas da Índia. Rio de Janeiro: Papéis e Cópias, 1997.
LIMA, V. C. L. O Yoga como caminho de elevação na espiritualidade e na saúde. Dissertação de Mestrado em Ciência da Religião. João Pessoa: UFPB, 2010.
OBSERVADOR. UNESCO declara yoga Património Imaterial da Humanidade. 01/12/2016. Disponível em: http://observador.pt/2016/12/01/unesco-declara-yoga-patrimonio-imaterial-da-humanidade/, Acesso em: 15/08/2017.
PELEGRINI, S. C. A.; FUNARI, P.P. O que é patrimônio imaterial. São Paulo: Brasiliense, 2008 (Col. Primeiros Passos, 331).
UNESCO. Decision of the Intergovernmental Committee: 11.COM 10.B.17. Takes note that India has nominated Yoga (No. 01163) for inscription on the Representative List of the Intangible Cultural Heritage of Humanity. Disponível em: https://ich.unesco.org/en/decisions/11.COM/10.B.17, Acesso em: 22/08/2017.
UNESCO. WHC (World Heritage Convention). Região Ásia e Pacífico (Lista Geral). Disponível em: http://whc.unesco.org, Acesso em: 20/08/2017.
ZIMMER, H. Filosofias da Índia. São Paulo: Palas Athena, 1986.
A cultura indiana é milenar e a sobrevivência dessa tradição que inclui o yoga independe de iniciativas ocidentais de salvaguardá-la enquanto patrimônio imaterial. Que pensas disso? Mais: são eles ou somos nós que precisamos desse reconhecimento?
ResponderExcluirOi Alina, muito grata por sua questão, pois nos faz aprofundar as reflexões sobre as pesquisas em torno do patrimônio cultural, área que me dedico há mais de 8 anos. Mas vamos lá à minha compreensão. A Índia já possui 35 patrimônios materiais chancelados pela UNESCO e em 2011 houve mais de 213 solicitações de registro de patrimônio imaterial. Devemos lembrar que quem solicita é uma comunidade local ou instituição e então o pedido é avaliado pelo comitê da UNESCO. Ou seja, a busca tem partido do próprio Oriente no sentido de buscar esse reconhecimento e inserir-se nos polos de decisão mundiais, não deixando essa premissa apenas no controle do Ocidente. Para mim, essa tem sido muito mais uma questão política, no sentido de demarcar território e visibilidade, pois independente da chancela são tradições milenares que sobrevivem com ou sem o reconhecimento pela própria apropriação e preservação cultural do próprio povo e simpatizantes em outras partes do mundo.
ExcluirOi Janaina, parabéns pelo trabalho, muito interessante!
ResponderExcluirVou aproveitar a pergunta da Alina, porque o que eu gostaria de comentar se relaciona com a pergunta que ela fez. Sabemos que os decoloniais apresentam uma perspectiva muito crítica em relação a essas iniciativas de salvaguarda à cultura oriental, por parte do Ocidente. Catherine Walsh é um exemplo. A autora (2009, p. 16) analisa que o reconhecimento atual à diversidade cultural que presenciamos na verdade nada mais é do que uma estratégia de dominação, que mantém essa lógica colonial através da retórica do multiculturalismo, assim chamado pela autora de multiculturalismo funcional. Uma nova lógica, agora dentro do capitalismo multinacional, se mostra aberta para a diversidade cultural mas assegura o controle sobre os interesses da lógica de mercado. Walsh acrescenta que a UNESCO tem tomado medidas que procuram assegurar a diversidade cultural, mas a enxerga como ameaça. Quer dizer, isto iria muito além do reconhecimento da diversidade, seria uma estratégia política de inclusão destes povos dentro de um modelo globalizado, a partir de interesses de mercado. Seria uma forma de manter o controle. De que forma você enxerga essa postura decolonial? Abraços
WALSH, Catherine. Interculturalidade crítica e pedagogia decolonial: in-surgir, re-surgir e re-viver. In: CANDAU, Vera Maria. Educação intercultural na América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 letras, 2009. p. 12 – 43.
Pepita Afiune
Olá Pepita, agradeço sua contribuição para essa reflexão que se torna agora mais rica trazendo à tona esse elemento que tem leituras variadas entre os intelectuais. Minhas referências sobre o pós-colonialismo e/ou decolonialismo advém de Boaventura Santos (2004), Spivak (2010) e Ballestrin (2013) - este último trazendo essa discussão para as especificidades da América Latina - e entendo que a crítica a perpectiva de uma "nova roupagem para a dominação cultural" é extremamente pertinente, entretanto, Spivak já chamava a atenção para um movimento de subversão, de tomada de território (político e cultural) no sentido de recusar "porta-vozes" e falar por si mesmos, como sujeitos, trazendo suas experiências, seus posicionamentos diante da alteridade. Os próprios critérios da UNESCO de patrimonialização foram forçados à mudar sob vários aspectos em razão de demandas de países do oriente (cita-se nesse caso principalmente o Japão) que exigiram uma nova percepção do patrimônio, assim também tem sido com o México. Novas categorias, jamais imaginadas pelos decisores ocidental haviam sido cogitadas até que populações emanando de suas diversidades cobraram, enquanto protagonistas, essa revisão do olhar. Mesmo "incomodada" a UNESCO (enquanto instituição) precisou ouvir outras vozes que destoavam de suas premissas, isto posto que o número de falantes aumentou, suas vozes se elevaram, saíram do silenciamento outrora imposto. As crises econômicas e políticas no Ocidente abriram brechas para um reordenamento da própria geopolítica do conhecimento como afirmou Mignolo (2003). São novas articulações, novos interlocutores e a solicitação de patrimonialização que emerge do Oriente junto à UNESCO ressoa muito mais como uma reescrita de paradigmas que não servem mais. É um processo tenso, não-consensual, mas que está questionando tanto a perspectiva da globalização convencional quanto apresentando alternativas de uma transmodernidade (Segrera, 2005) que coloca em xeque o exclusivismo europeu na ótica da produção cultural e reconhecimento de outras culturas. Não é um debate terminado, há muito ainda por ocorrer, mas as ideias estão em circulação e a apropriação dos antigos códigos de patrimonialização, agora ressignificados sob padrões locais têm sido uma dor de cabeça para instituições de salvaguarda patrimonial e isso com certeza tem tornado os estudos dessa temática muito mais interessantes e cheios de possibilidades.
ResponderExcluirBALLESTRIN, Luciana. América latina e o giro decolonial. Revista Brasileira de Ciência Política, v. 11, p. 89-117, 2013.
MIGNOLO, Walter. Histórias locais/projetos globais: colonialidade, saberes subalternos e pensamento liminar. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2003.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma sociologia das ausências e uma sociologia das emergências. In: Boaventura de Sousa Santos (Org.). Conhecimento prudente para uma vida decente: ‘um discurso sobre as ciências’ revisitado. São Paulo: Cortez, 2004. p. 777-821.
SPIVAK, Gayatri. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Editora UFMG, 2010.
Olá Janaína. Bacana seu texto e a problematização de sua temática. Habito uma cidade que "elabora" patrimônios materiais e imateriais para construir uma identidade de germanidade que pouco possui. A Yoga, em suas mais diversas práticas, traz um questionamento acerca do ritmo acelerado de vida que nos é "imposto" no Ocidente. Nesse sentido - espero não estar fugindo de sua temática - que obras indicas para a discussão dessa problemática? Obrigado!
ResponderExcluirOi Maicon, muito grata por sua visita por aqui. Então, me propôs uma tarefa complexa, mas vamos lá! Primeiro sobre essas "elaborações de patrimônios" para consolidar identidades me lembra muito o livro "A invenção das tradições" de Eric Hobsbawm. Sobre patrimonialização gosto muito dos textos da professora Sandra Pelegrini. Já passei por experiências semelhantes, mas de apagamento de memórias e patrimônios indígenas e negros em lugares onde residi e isso sempre nos coloca um grande desafio enquanto historiadores. Devemos descortinar esses artifícios e problematizar sempre essas manipulações de construções identitárias.
ResponderExcluirNo caso do Yoga e nosso tempo acelerado, acredito que a prática nos faz colocar o próprio tempo em perspectiva. Eu, particularmente em minha vida pessoal tenho me obrigado a repensar essa vida sem qualidade, principalmente com todas as exigências da academia, e por isso indico as leituras abaixo:
FEUERSTEIN, Georg. A Tradição do Yoga. História, Literatura, Filosofia e Prática. Tradução Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo, Pensamento, 2006. 576p.
FEUERSTEIN, Georg. Uma visão profunda do Yoga. Teoria e prática. Tradução Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo, Pensamento, 2005. 287p.
FEUERSTEIN, Georg. As virtudes do Yoga. Antigos ensinamentos para esta época de crise global. Tradução Marcia Fiker. São Paulo, Pensamento, 2009. 303p.
FRAWLEY, David. Uma visão ayurvédica da mente. A cura da consciência.Tradução: Alípio Correia de Franca Neto. São Paulo: Editora Pensamento, 2000.
Olá professora Janaína. Parabéns pelo belo e instigante texto, a cultura indiana é realmente fascinante e desafiadora, com toda a sua filosofia e universo singular, que sem dúvida ainda demanda muito estudo e uma maturidade na cabeça de nós estudantes de história e filosofia ocidentais.
ResponderExcluirParabéns Janaína pela temática e pela abordagem aos elementos culturais tão renegados ao desconhecimento no ocidente. Minha questão é a seguinte: diante das conjunturas econômicas que se sobrepõem às culturais, até que ponto a UNESCO possui legitimidade para reconhecer ou não patrimônios orientais? E até que ponto esse processo não é, por um lago etnocêntrico ou uma mea-culpa por outro, como os indianos veem essas posturas?
ResponderExcluirEu comecei a praticar o shivam yoga apenas a 4 meses e com este curto período de tempo, percebo que por ser uma cultura milenar, de alguma forma tenta prevalecer nesse mundo atual onde tudo muda em segundos. Além de ser uma cultura milenar que resiste as intempéries das mudanças, também pode ser considerado um bem cultural e patrimonial pois fez parte de muitos cidadãos e ainda participa.
ResponderExcluirPercebo que mesmo com tantas mudanças ocorrendo a todo instante, muito se tem a agregar culturalmente e patrimonialmente no mundo, pois a todo instante há algo a ser extinto ou nascendo, assim a importância de termos um vasto patrimônio seja imaterial, material ou cultural, deve ser importante pois além de guardar alguma tradição, por que assim as futuras gerações saberão de algo que já pode ter sido extinto e entao pesquisar mais coisas a respeito.
Bruna Liana Teza Canarin - Academica de História - UFOP