Bruna Soalheiro

FONTE DE VIDA: POSSIBILIDADES DE ANÁLISE DE UMA FONTE CRISTÃ PRODUZIDA NA ÍNDIA MOGOL NO FIM DO SÉCULO XVI
Bruna Soalheiro

A presente reflexão tem como objetivo apresentar uma possibilidade de análise para uma obra jesuíta que a compreenda para além das tradições cristãs que a conformaram. Propomos uma abordagem que insira o texto no contexto em que foi produzido, entendendo a fonte como um produto de um processo de acomodação próprio dos missionários da Companhia de Jesus, porém fundamentalmente marcado por um ambiente de negociação político-religiosa. Ainda que representativa de uma estratégia de comunicação evangelizadora, Fonte de Vida apresenta traços estilísticos e temáticos  - o lirismo e o tema da unidade de Deus - que só podem ser devidamente apreciados se confrontados com a literatura Akhlaq e com uma determinada vertente do islamismo: o sufismo.

Fonte de Vida foi escrita por Jerônimo Xavier, nascido em 1549, sobrinho-neto de Franciso Xavier. Jerônimo, antes de ingressar na Ordem, havia estudado na Universidade de Alcalá e, quando admitido na Companhia de Jesus (1568), adotou o nome de família do tio. Chegou a Goa no ano de 1581 e dez anos depois, a pedido do soberano mogol Akbar, foi enviado à sua corte, acompanhado de um padre e um irmão: Bento de Góis e Manuel Pinheiro. Compunha-se assim o terceiro grupo de missionários que foram enviados ao norte da Índia. Foi nessa ocasião que Xavier escreveu Fonte de Vida, obra de que trataremos aqui, lida a partir de sua publicação contemporânea, em espanhol.

Fonte de Vida possui a seguinte estrutura geral: a obra divide-se em cinco livros, que tratam respectivamente dos seguintes temas: 1. o conhecimento de Deus e de sua verdadeira lei; 2. as coisas que de Deus ensina, a lei dos cristãos e quão conforme são à razão; 3. a divindade de Cristo; 4. os mandamentos da lei cristã e da lei dos mouros; 5. as ajudas que se dão na lei dos cristãos para viver a serviço do Criador e a vantagem em que nisso leva da lei dos mouros e das outras. Estes cinco livros são antecedidos pela apresentação da fé cristã “em modo de oração” e pela dedicatória do tratado, feita a Akbar. Xavier incluiu ainda, na parte introdutória de sua obra, uma seção chamada “Al curioso lector y deseoso de la verdad”. Nela, o missionário faz uma brevíssima introdução, anunciando os propósitos de seu livro. No presente momento, teremos como foco a oração que apresenta a fé cristã e a dedicatória.

É preciso dizer ainda que, durante o reinado de Akbar, foi estimulado na Índia um ciclo de debates e a produção de textos, tais como comentários e traduções de obras sagradas. Este estímulo institucional deve ser compreendido como meios para fazer convergir os projetos políticos de Akbar (KOCH, 2012: 547). Uma vez compreendido que seu governo fora cenário de negociações sociais, políticas e estéticas que apontavam para a elaboração de um novo discurso que respaldasse sua soberania sobre os territórios e populações em áreas por eles recém-conquistadas no subcontinente indiano, nós devemos aqui prosseguir, atribuindo um lugar aos jesuítas nesse ambiente.

Foi nesse contexto, mais precisamente no ano de 1596, que o missionário Jerônimo Xavier escreveu uma obra intitulada Fonte de Vida, dirigida ao imperador. Ao elaborar esse tratado, o jesuíta dedicou-se principalmente a dois objetivos: apresentar a “Verdadeira Lei” ao soberano mogol e demonstrar a superioridade da lei cristã sobre o Islamismo.

Maijastina Khalos, tratando dos debates que envolveram, ao longo da antiguidade, cristãos e não-cristão, enfatiza que os diálogos travados entre eles

“Não significava uma busca mútua por uma verdade que pudesse existir, em algum lugar, para ambos encontrarem; mas sim implicava que os cristãos já haviam entendido a verdade e deveriam comunicá-la a não-crentes” (KAHLOS, 2007: 79).

Sendo assim, definir esses objetivos não confere nenhuma especificidade à fonte acima, apenas a insere em um amplo conjunto de obras chamadas de tratados apologéticos, isto é, textos cuja intenção é apresentar e defender o cristianismo frente a outro sistema de crenças. A Apologética é uma disciplina teológica cara aos cristiãos, que rendeu obras como De Civitate Dei contra Paganos, escrita no início do século V por Aurélio Agostinho, conhecido como Santo Agostinho, e Summa contra Gentiles, escrita por Tomás de Aquino na segunda metade do século XIII.

No caso da fonte aqui destacada, reiteramos que o formato de diálogo exacerba o caráter argumentativo e dialético da literatura apologética, projetando na voz do outro as questões a serem refutadas pelo cristão.

Não obstante, o que conferiu especificidade a Fonte de Vida enquanto tratado apologético foi, justamente, o contexto em que foi produzido e seu objetivo mais imediato: apresentar a Akbar argumentos de forma a convencê-lo da superioridade do cristianismo frente ao islamismo. O tratado, portanto, além de ter finalidade apologética, serviu como meio para os jesuítas se fazerem presentes nas instituições de debate inter-religioso patrocinadas pelo soberano.

No contexto multilinguístico mogol de negociação de tradições ético-religiosas distintas, observamos serem significativas a produção e circulação de textos de conteúdo político, isto é, que tratavam do tema da governança. Estamos fazendo referência aqui ao que Muzaffar Alam chama de “literatura Akhlaq”: a tradição literária composta por escritos ético-políticos influenciados pela obra Akhlaq-e Nasiri, escrita por Nasir al-Din al-Tusi no século XIII. Nesse gênero, a “correta conduta” de um régulo era um dos objetos principais, de maneira que o tratado escrito por Xavier e destinado a Akbar possuiria um propósito proselitista cristão inegável, mas associado a tal literatura política indo-persa. Dessa forma, para além de seu caráter apologético, Fonte de Vida assumiria, em alguma medida, papel análogo ao de obras da tradição turco-mogol, as quais articulavam religião, ética e política. Assim sendo, supomos que a obra de Jerônimo Xavier tenha sofrido alguma influência da produção textual especialmente destinada aos governantes.

De todo modo, vale ressaltar que, ainda segundo Alam, o tema da governança encontrava-se atrelado a um determinado entendimento da Sharia, especialmente no que diz respeito à relação entre governantes muçulmanos e governados não muçulmanos.

“[A] Sharī'a passou a ter mais de um significado durante este encontro entre árabes e não árabes; a língua do Leste Islâmico começou a se tornar uma mistura sincrética; um legado de cooperação e assimilação desenvolvido desde a época do Sultanato até o final do reino mogol; e situações de conflito tinham a tendência a serem resolvidas de acordo com um padrão formado por uma forte tradição política de acomodação do islamismo medieval” (ALAM, 2004: 12).

Um entendimento mais flexível e menos jurídico da Sharia propiciaria uma convivência mais tranquila entre muçulmanos e não muçulmanos, na mesma medida em que quão mais estrita fosse essa concepção, mais tensas seriam as relações sociais e políticas entre os seguidores de Maomé e os demais povos:

“Ainda assim, fica claro que a Shari’a, que guiava o padrão de governo mogol, tinha impacto na tradição de Nasirean Akhlaq, o que era reforçado pelo mundo que poetas e sufis haviam, em seus domínios, delineado em persa, um mundo em que era possível usar o termo shari’a não necessariamente, ou apenas, em um sentido legal limitado” (ALAM, 2004: 77).

No trecho acima, percebemos que o mesmo autor introduz ainda um outro elemento ao contexto político de que tratamos aqui. Ao lado da tradição persa de uma literatura ético-política que se debruçava sobre o tema da governança, Alam ressalta ainda a presença do sufismo nesse cenário. Ele acrescenta:

“Foi a crença sufista de unidade em multiplicidade, conhecida como waḥdat al- wujūd (Unidade do Ser), que forneceu a base da doutrina para todos esses desenvolvimentos no processo de síntese religiosa e amálgama cultural” (ALAM, 2004: 91).

Assim sendo, o conceito por nós grifado no extrato acima - waḥdat al- wujūd – é fundamental para que possamos prosseguir com nossa análise da obra de Xavier. Ele condensa nossas hipóteses acerca do uso de conceitos fundantes do islamismo e de sua vertente sufista ter emprestado a Akbar subsídios retóricos e ideológicos que viabilizassem e justificassem sua soberania e seu governo.

Um outro autor, Jonardon Ganeri, reitera as relações entre sufismo e política:

“A ideia que diferentes pontos de vista coabitam uma única matriz e que, nessa medida, são susceptíveis ao sincretismo, é o que difere a visão cosmopolita de pluralismo, cujo princípio cardinal é que a falta irreconciliável de consenso é, por si só, algo com valor político, social ou filosófico. Na Índia da Idade Moderna, esses pensamentos assumiram uma importância tanto política quanto filosófica. Por boa parte dos séculos dezesseis e dezessete (…) a doutrina sufista de wahdat al-wujud guiou uma busca por uma única visão espiritual que seria a base de todas as religiões” (GANERI, 2011: 32).

Propomos, desta forma, que Fonte de Vida deve ser necessariamente entendido em diálogo com a tradição jurídica, ética e político-religiosa que séculos antes da chegada dos missionários já tratava do tema da governança, com ênfase no desenrolar do conceito de Shari’a tal qual exposto por Alam. Além disso, é preciso considerar a presença importante de uma corrente específica do pensamento islâmico, chamada de sufismo, cujo papel de mediação nas relações entre muçulmanos e não muçulmanos na Índia mogol foi determinante. Temos, portanto, dois elementos indispensáveis a serem considerados quando analisamos o contexto de produção de Fonte de Vida: a literatura Akhlaq e o sufismo.

Assim, é preciso ter em mente que Xavier escreve para uma Índia perso-islamizada, na qual várias linguagens políticas dialogam. Para Alam, o papel do idioma persa na estruturação do poder político mogol na Índia, bem como para a criação de uma espécie de amálgama social que pudesse dar conta das diferenças socioculturais e religiosas, foi decisivo. “O persa, então, forneceu as condições para que os mogóis pudessem construir uma classe de aliados a partir de grupos sociais e religiosos heterogêneos” (ALAM, 1998: 324). Sendo assim, é sintomático, do ponto de vista político, que Fonte de Vida tenha sido escrita em persa, pois insere o jesuíta no contexto político estruturante de que falamos.

Feitas todas estas observações preliminares e contextuais, o que nos interessa no presente momento é apenas indicar uma possibilidade de análise de uma fonte cristã que seja pautada não somente na inserção desta fonte na tradição apologética “ocidental” ou latina que necessariamente a configurou, mas fundamentalmente entender este texto de época como um texto que dialoga com distintas tradições político-religiosas não cristãs. Dito de outra forma, uma leitura de “Fonte de Vida” que desconsiderasse sua intenção adaptativa – para usar um termo que se remete justamente à acomodação jesuítica – perderia de vista justamente a natureza de sua produção, de sua finalidade, de sua conformação e de seu conteúdo.

Sustentamos, portanto, que esse tratado apologético, ainda que possua inúmeras semelhanças com os tradicionais tratados cristãos tomistas (em especial Summa Contra Gentiles e De Rationibus Fidei), foi produzido num contexto estético-estilístico misto e negociado. Desta forma, se o conteúdo é tomista e representativo da segunda escolástica, a forma lírica, a opção pela forma dialógica e a ênfase em determinadas questões em detrimento de outras refletem necessariamente tal contexto de produção negociado e proselitista.

Pontuadas as características gerais do contexto no qual Fonte de Vida foi escrita, é necessário, complementarmente, buscar estes pontos de “negociação” no próprio texto.

Conforme dito acima, os cinco livros que compõem Fonte de Vida são antecedidos por duas seções a serem aqui analisadas: (1) a apresentação da fé cristã “em modo de oração”; e (2) a dedicatória da obra, feita a Akbar.

Ambas as partes são importantes para nossa análise. A primeira porque apresenta, de forma um tanto poética, os mistérios do cristianismo. A segunda porque apresenta o livro e seu propósito a Akbar, defendendo a importância de se manter uma relação próxima entre reis e sábios. Em conjunto, sua relevância reside no fato de destoarem – principalmente no que diz respeito aos aspectos formais e estilísticos do texto – do corpo da obra propriamente dito, isto é, do tratado em formato dialógico contido nos cinco livros seguintes.

Passemos a uma sucinta descrição destes elementos pré-textuais. Na primeira parte de sua obra, Jerônimo Xavier apresenta o princípio, o progresso e o fim de todas as coisas – isto é, Deus. Suas perfeições são enumeradas: Ele tudo sabe, tudo pode, tudo tem; é eterno, infinito e incompreensível; sua natureza é distinta da natureza das criaturas. É perfeito sem qualidade e por isso é sumo. Está em todo lugar, sem ser compreendido, e por isso é universal. Tudo obra sem mudança e por isso é imutável. Em seguida, Xavier aborda o mistério da Santíssima Trindade. O autor acrescenta ainda que Deus deu os profetas para que nos ensinassem, os anjos para que nos guardassem e seu único filho natural para que, feito homem, pudéssemos ver, ouvir, seguir e imitar (XAVIER, 2007 [1600]: 62-4).

Ao longo dessa espécie de preâmbulo, percebemos que o autor ainda se utiliza de algumas imagens um tanto paradoxais para alguém que se dedica a debater e escrever em nome da verdadeira lei. Xavier nos diz que Deus ensina sem ruído de palavras, sem tinta e sem livros. Ensina e dá entendimento para ser entendido. Dá doutrina e a capacidade para entendê-la. No entanto, ele também diz que não se conhece Deus pelo entendimento, já que quem mais alcança Deus é aquele que, quanto mais se chega Dele, mais distante fica de Seu entendimento (XAVIER, 2007 [1600]: 62-5).

Gostaríamos de ressaltar a semelhança desta proposição de Xavier com o que São Tomás de Aquino recomenda no capítulo segundo de De rationibus fidei, intitulado Qualiter sit disputandum contra infideles (Como se deve disputar com os infiéis). No entanto, percebemos também que a semelhança no conteúdo se choca com a distinção na forma. Afinal, é de maneira um tanto lírica, com imagens, metáforas e paradoxos, que Jerônimo Xavier abre a sua obra, como podemos perceber já no extrato destacado no alto desta página: “Al princípio, sin princípio, de quien depende el princípio, progresso e fin de todas las cosas, que al Dios alto, soberano y todo poderoso, sean dadas gracias infinitas” (XAVIER, 2007 [1600]: 61). O lirismo de Xavier aparece, pois, como uma alternativa, ou adaptação, à opção estilística escolástica de Tomás de Aquino.

Esse tom poético distingue-se da linguagem dos tratados apologéticos tomistas ou escritos metafísicos em geral, distinguindo-se também do estilo de escrita dos cinco livros principais de Fonte de Vida. Na parte introdutória de Fonte de Vida, não há definição dialética e racional de Deus. Ao contrário, trata-se de apresentar a Doutrina, isto é, essencialmente as mesmas ideias presentes na Suma de Aquino, em uma forma não dialética, não racional, mas sensível, metafórica, poética, sinestésica.

Partindo da identificação desses elementos estilísticos e da ausência de um rigor escolástico, nosso único e exclusivo objetivo aqui é indicar que, nessa parte do texto, ao contrário de recorrer a uma retórica dialética, o autor faz uso de figuras de linguagem, as quais conferem a sua “oração” outros resultados retóricos e estéticos. Tal análise, contudo, encontra dois limites. Por um lado, não procuramos defender que não existe lirismo em escritos cristãos, por outro, não temos a intenção de afirmar que o caráter poético desta parte de Fonte de Vida é resultado exclusivo da influência muçulmana sufi.

Nossa hipótese, localizada entre esses dois polos, é a de que Xavier abre dessa forma sua obra para atingir um determinado tipo de leitor. Seria uma espécie benevolentiae captati, ou seja, uma “ordenação das palavras para influir com eficácia na mente do receptor” (PÉCORA, 2001: 20) para alcançar o círculo de leitores composto por cortesãos sufis ou pessoas politicamente influentes, além, evidentemente, do próprio Akbar.

Gostaríamos de ressaltar que já no segundo fólio de sua obra, Xavier aborda a questão central da divergência teológica cristo-islâmica: a natureza única de Deus e, ao mesmo tempo, o mistério da Santíssima Trindade. O missionário faz questão de afirmar a unicidade de Deus e, no mesmo parágrafo, inserir as três pessoas divinas: Pai, Filho e Espírito Santo. Além disso, ele já antecipa nesse mesmo extrato que a grandeza infinita de Deus vence a capacidade de entendimento do homem. Ou seja, nesse momento, Xavier não inicia um debate racional e dialético sobre a natureza de Deus. Ele apenas afirma, simultaneamente, a ideia central do wahdat al-wujud e o mistério da Santíssima Trindade.

Assim, nessas primeiras páginas, o jesuíta apresenta algumas das ideias principais da Doutrina católica, sem opô-las à crença sufi fundamental da unidade de Deus. Além disso, esse extrato deixa claro que o objetivo da parte inicial de Fonte de Vida não é defender apologeticamente, recorrendo ao entendimento e à razão, à superioridade da lei cristã. Ao contrário, nos parece evidente, pelo uso de paradoxos e metáforas, que Xavier, nesse momento, não tem interesse em argumentar, debater, convencer ou dissuadir. Seu principal objetivo, acreditamos, é convidar seu “público alvo” a ler o seu tratado. Para isso, a aproximação com as ideias e com o que supomos, baseando-nos na bibliografia, ser um certo lirismo sufi, foi fundamental.

Reiteramos, portanto, o duplo caráter da obra de Xavier. Por um lado, trata-se de um tratado apologético, destinado, por definição, à argumentação a favor da superioridade da lei cristã em detrimento da lei islâmica, o que ficará bem claro nos cinco livros que se seguem. Mas, além disso, trata-se de um tratado com um destinatário específico: Akbar, o imperador mogol, cujos projetos políticos passavam por patrocinar a produção de obras escritas e pictóricas, as quais criariam um substrato discursivo para sua soberania política entre uma população composta por diferentes grupos linguístico-culturais e religiosos.

Para que seu objetivo de ser fazer ouvir fosse atingido, Jerônimo Xavier optou por acomodar estilisticamente a apologética tomista às linguagens perso-islamizadas da Índia dos tempos de Akbar. Longe de ignorar a tradição escolástica que respalda a formação do jesuíta, nosso objetivo foi, simplesmente, lançar alguma luz a elementos não necessariamente cristãos que também compõe Fonte de Vida, indicando uma possibilidade de análise desta fonte.

Referências
Bruna Soalheiro é bolsista de pós-doutorado PNPD-CAPES no programa de pós-graduação em História da UERJ.

Fonte:
XAVIER, J. Fuente de Vida: Tratado apologético dirigido al Rey Mogol de la India en 1600. San Sebastián: Universidad de Deusto, 2007.

Bibliografia:
ALAM, M. Languages of Political Islam in India. Orient Blackswan, 2004.
____________. The Pursuit of Persian: Language in Mughal Politics. Modern Asian Studies, vol. 32, n. 2, p. 324, maio 1998.
GANERI, J. The Lost Age of Reason: Philosophy in Early Modern India 1450-1700. EUA: Oxford University Press, 2011.
KAHLOS, M. Debate and Dialogue: Christian and Pagan Cultures. Aldershot: Ashgate, 2007.
KOCH, E. Jahangir as Francis Bacon's Ideal of the King as an Observer and Investigator of Nature. Journal of the Royal Asiatic Society, v. 19, n. 3, p. 297, 2009.  Disponível em <http://journals.cambridge.org/abstract_S1356186309009699>. Acessado em 3/09/2017.
PÉCORA, A. Máquina de gêneros São Paulo: Editora Universidade de São Paulo, 2001.

10 comentários:

  1. Excelente texto! Mas sinto que para compreender a composição do texto fazem-se necessárias: 1) a análise das técnicas de argumentação do século XVI, especificamente a tradição de Raymond Lull; 2) a comparação com outros textos apologéticos do período também produzidos na Ásia, como por exemplo os livros de Matteo Ricci na China e o compêndio de Pedro Gomez no Japão; e 3) a consideração do modelo do diálogo também a partir dos diálogos europeus, muito em voga neste momento, que vão culminar no final do século e começo do século XVII com Galileo, por exemplo. É um trabalho com enormes possibilidades! Bons estudos! Ass: Rômulo Ehalt

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    1. Caro Romulo,

      muito obrigada por sua leitura e suas questões!

      Sobre a primeira, como em geral me atenho a tradição escolástica própria da Companhia de Jesus, tenho dificuldade em perceber uma possivel relação com o tradição de Raymond Lull. Em que medida o franciscano pode ter influenciado toda uma escola de disputa jesuítica? Não saberia dizer... mas vou buscar mais informações a partir da sua pergunta.

      (2) Matteo Ricci, vc sabe, tá aqui na estante esperando a hora dele. Sem dúvida, a partir do confronto entre estas fontes, as possibilidades de análise se multiplicam! Te agradeço mais especificamente por alertar-me quanto a Pedro Gomez.

      3) A tradição do diálogo, dentro da Companhia de Jesus, esta bastante ligada a disputatio, a dialética (neo)escolástica, aos casos de consciência, enfim, a formação própria dos membros da Companhia em seus colégios. Não obstante, recorrer ao diálogo, como já posto por Alcir Pécora, busca garantir uma eficácia retórica nem marcada entre os jesuítas, como por exemplo Nóbrega em "diálogo sobre a conversão do gentio", entre outros. Além disso, uma vez esta maneira de debater "aplicada" em outros espaços cuja a tradição de disputas tem outros contornos, a maneira de disputar dos missionários confronta-se forçosamente com outros constrangimentos e outras contingencias, as quais, a seu turno, reconfiguram a atuação dos missionários. De toda forma, retornarei a Galileu com outros olhos após sua sugestão. Obrigada!
      Bruna Soalheiro

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  2. Saudações!

    Texto bastante pertinente. Uma curiosidade que tenho decorre de como o cristianismo é lido no Oriente, uma vez que, em perspectiva ocidental, temos um olhar distinto. Ademais, faço a ressalva de cristianismos no plural quando nos referimos à história medieval. A discussão proposta é essencialmente importante, uma vez que podemos cartografar os elementos que diferem do Oriente e Ocidente, sobretudo nas representações pictóricas, imagéticas de Jesus Cristo. Gostaria que fossem feitos alguns apontamentos quanto o caráter político de dessemelhança entre como o Oriente lê o Cristianismo de uma forma mais ou menos geral.

    Abraços,

    Rômulo Rossy Leal Carvalho - UFPI

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    1. Obrigada por sua leitura e por suas questões, Rômulo!

      Como vc bem pontuou, é necessário pensar num cristianismo no plural: os cristianismos. Do meu ponto de vista, não apenas para o período medieval, mas para a modernidade também. Além disso, supor que exista “um” cristianismo que pode ser lido num suposto espaço homogêneo “oriental” coloca-nos algumas dificuldades. Para tentar responder melhor as suas questões, vou dividir estas dificuldades segundo duas naturezas:

      - o sistema de crenças que “recebe” o cristianismo no “Oriente” varia: brâmanes, budistas tibetanos, sunitas, outros cristãos de rito não latino, enfim, a uma infinidade de possibilidades de acomodações e apropriações neste vasto espaço oriental. Em cada caso, o cristianismo, em seus aspectos de crença e seus desdobramentos políticos, estava submetido a dinâmicas específicas. No vocabulário jesuítico, por exemplo, isto se reflete inclusive no uso de determinadas categorias distintas entre si e que, de certa forma, já determinam algum grau de hierarquia, como: gentio, idólatra, infiel etc.
      - as contingências políticas que configuram estas possibilidades de apropriação, isto é, se o cristianismo será apresentado em um espaço colonial ou não-colonial. Só para nos mantermos no recorte indiano, é muito distinta a possibilidade de apropriações e leituras em Goa – um espaço colonial que contou com o estabelecimento do Tribunal do Santo Ofício – ou no norte da Índia, espaço não colonial com um governo bastante estruturado. No primeiro, há uma possibilidade de imposição coercitiva de uma suposta ortodoxia. No segundo, a negociação, o diálogo, a acomodação e o convencimento forçosamente dão outro tom a estas relações de leitura e apropriações.

      E como vc bem pontuo, estas dinâmicas muitas vezes correspondem a expressões retóricas e estéticas bastante interessantes, como a elaboração de textos escritos e imagens. Deixo aqui uma sugestão que talvez te interesse.

      http://www.brill.com/cn/mir-al-quds-mirror-holiness-life-christ-emperor-akbar

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  3. Saudações. Essa é uma proposta de estudo bastante interessante. Eu gostaria de saber: qual foi o impacto que a obra de Xavier causou? Ele conseguiu converter alguém, ou influenciar seus contemporâneos de alguma forma?

    Raphael Meza de Andrade

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    1. Olá, Raphael, muito obrigada por sua pergunta, que, aliás, é um desafio.

      Não tenho informações de pessoas convertidas diretamente por Xavier, ou mesmo pelo impacto de sua obra, ainda que se aceite que ocorreram conversões dentre integrantes da corte Mogol.
      Sobre seu diálogo ter tido alguma influência, eu prefiro pensar nesta obra, como exposto no artigo, dentro de um movimento maior que estava ocorrendo na Índia. Neste sentido, Xavier foi influenciado e pode ter influenciado aqueles com quem conviveu, em especial alguns muçulmanos próximos a Akbar.
      Peço desculpas por não te apresentar maiores informações e aproveito pra agradecer mais uma vez pela questão, que me obrigará, daqui por diante, a me interrogar mais profundamente.

      Bruna Soalheiro

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  4. Boa Tarde
    Gostei do Texto e até mesmo me surpreendi por ler um texto de um assunto tão pouco trabalhado , mas senti falta de uma melhor explicação sobre o que é a fonte da vida, pois afinal para mim que não li as obras citadas acima, não compreendi de que forma a mesma é representada? ou se ela tem alguma forma definida?
    ass: Eliane Luczkiewicz da Silva

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    1. Olá, Eliane, obrigada por sua questão.

      Se te compreendi corretamente, vc gostaria de saber qual o significado de fonte de vida dentro da obra de Xavier, a qual ela mesma leva este título.
      Então, ela de ser a própria obra, segundo minha leitura, a fonte de vida, para Xavier, é o que ele está expondo em seu texto: o Evangelho, o Cristianismo e a vida de Cristo ele mesmo. Pelo que constatei em minha análise, não parece ser possível entender esta expressão "fonte de vida" sem levar em conta estes três aspectos necessariamente imbricados.
      Era isso mesmo?
      Obrigada!
      Bruna Soalheiro

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  5. A atuação dos jesuítas na Índia Mogol pode ser comparada a atuação que a companhia de Jesus teve no Brasil no século XVI?
    Gigliele Pereira fontes

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    1. Como já foi exposto numa resposta acima, tanto a natureza do sistema de crença que "recebe" o cristianismo quanto as dinâmicas políticas envolvidas precisam ser avaliadas e explicitadas nestas possibilidades metodológicas de comparação.
      Para o caso da América portuguesa e espanhola, para além do que já foi exposto acima sobre Oriente, eu gostaria de enfatizar um terceiro aspecto, isto é, uma especificidade estratégica ou missiológica para estes espaços. Do ponto de vista jesuíta, havia uma necessidade pragmática de organização do modo de viver dos nativos para "facilitar" a catequese e a conversão. Esta necessidade, cujas implicações políticas e culturais se fizeram sentir drasticamente, dizia respeito a ordenação de vários aspectos da vida desses povos: onde eles moravam, a fixação desta moradia, como estabeleciam laços matrimoniais, se faziam sacrifícios humanos, qual a sua relação com o trabalho, em que medida faziam uso da escrita etc. Tais questões, centrais na América, não surgiram da mesma forma em sociedades orientais em geral, sedentárias, com um regramento social e uma organização política mais compreensível para os missionários.
      Isto se desenvolveu, na América, no estabelecimento dos aldeamentos, enquanto que nos espaços orientais este recurso teve nula utilização, e a acomodação dialógica revelou-se mais eficaz.
      Não obstante, a Companhia de Jesus é uma ordem com um agir político e missionário até certo ponto coeso, formulado a partir de características muito próprias desta Ordem. Para esclarecer mais este ponto, sugiro a leitura de José Eisenberg, cujo livro vai resenhado no artigo abaixo:
      https://nuevomundo.revues.org/400?lang=pt

      Bruna Soalheiro

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